O que fazer quando o outro segue em frente?

Há dores que não gritam. Elas simplesmente pesam. Concorda comigo?

O fim de um relacionamento, quando o outro já parece ter seguido adiante, toca uma ferida profunda: a de perceber que o amor, por mais sincero que tenha sido, não garante permanência. E talvez o mais difícil não seja o fim em si, mas o fato de que o outro parece bem enquanto nós ainda estamos tentando respirar.

Sob a luz do humanismo e do existencialismo, essa experiência não é uma falha pessoal. É um retrato do que significa existir em liberdade. O ser humano é, antes de tudo, um projeto em constante movimento. Somos seres de desejo, e o desejo não pede licença para mudar de direção. Quando o ex segue com outra pessoa, somos convidados, ainda que à força, a encarar a finitude daquilo que acreditávamos eterno.

Na Terapia Centrada na Pessoa, aprendemos que cada pessoa é um processo único, movido por uma tendência à atualização, uma busca por crescimento e sentido. O problema é que, quando amamos, muitas vezes confundimos o crescimento do outro com a nossa necessidade de continuidade. Queremos que ele permaneça onde o deixamos. Mas o amor, na perspectiva de Carl Rogers, é reconhecimento do direito do outro de ser quem é, mesmo quando isso nos custa. Ou seja, não podemos falar de posse. Não faria sentido “posse” e “amor” andando de mãos dadas.

A dor que fica é legítima. Ela sinaliza que algo em nós também precisa se reorganizar, pois não é apenas o outro que partiu, mas também uma parte da nossa identidade que se desfez. O desafio é o de encontrar na dor um convite para sermos autênticos. É preciso olhar para si, reconhecer as próprias carências, e descobrir o que de fato permanece quando o outro se vai.

Por isso, eu preciso te dizer que viver o luto é indispensável nesse processo. Não há superação verdadeira sem atravessamento. O luto é o tempo em que o corpo, a mente e o coração aprendem, lentamente, a aceitar o que a razão já sabe, mas ainda não sente. É o intervalo necessário para que o passado encontre um lugar simbólico dentro de nós. Ignorá-lo, racionalizá-lo ou apressá-lo é como tentar respirar sem ar. A cura não vem da negação, mas da permissão: permitir-se sentir, entristecer, lembrar, enfraquecer e, pouco a pouco, reencontrar forças.

É preciso estar atento ao que você sente, mesmo quando parece ilógico. Há dores que não se explicam com argumentos. A tristeza, a saudade, o ciúme, o vazio… tudo isso é parte da linguagem emocional que pede uma escuta. O ser humano não é feito apenas de pensamento. Ele é feito também de carne, de história e de afetos. Tentar compreender o fim de um amor apenas com a razão é amputar a experiência pela metade.

A vida não pode ser vivida com o intuito de se evitar as perdas, pois elas ocorrerão, inevitavelmente. Afinal, a morte, por exemplo, é um evento de perda inevitável, por exemplo. Todos nós passaremos por ela um dia. Então precisamos nos abrir à experiência, mesmo ela sendo dolorosa. Dar um sentido à vida é escolher continuar existindo depois que a perda acontece.

Talvez o amor não tenha acabado. Talvez ele apenas mudou de forma. Assim, temos um chamado silencioso para que voltemos a nos escolher.

Um dia, o barulho da saudade se acalmar, e nesse momento, talvez você perceba algo simples e profundo: que a vida não levou o amor embora, mas sim, que ela apenas o devolveu para onde ele sempre pertenceu: De volta a você.

Ame-se sempre em primeiro lugar.

Por que o concurseiro jurídico não encontra satisfação (à luz da psicologia)

Na Gestalt-terapia, Jorge Ponciano Ribeiro descreve o Ciclo do Contato como o processo natural que nos mantém vivos e conectados com o mundo. É o movimento entre o self e o meio ambiente, em que sentimos uma necessidade, tomamos consciência dela, nos mobilizamos, agimos, entramos em contato e, por fim, nos retiramos satisfeitos. Quando esse ciclo flui bem, há crescimento e equilíbrio. Quando se interrompe, surge o sofrimento.

Agora pense no concurseiro jurídico. Ele sente uma necessidade legítima que é a de alcançar a estabilidade, o reconhecimento, o pertencimento. Porém, essa necessidade é logo engolida por diversas crenças rígidas que são difundidas, tais como:

  • É preciso sangrar até passar.
  • Preciso passar nesse concurso para ter a minha vida e ser feliz.
  • É necessário abdicar da vida pessoal, dos amigos, cônjuge e familiares para estudar mais.
  • Tenho que fazer, no mínimo, 8 horas líquidas de estudo por dia.

Com isso, o ciclo natural do contato se quebra. Em vez de sentir e se ajustar à vida, esse candidato entra em uma espécie de modo automático, tentando controlar… o incontrolável.

O concurso público se torna, cada vez mais, promessa de salvação. Muitos candidatos vêm de contextos familiares que exaltam o serviço público, ou de experiências frustradas na advocacia. O estudo vira uma missão de sobrevivência, uma tentativa de provar valor a si ou para outros a seu redor, seja porque se sente rejeitado ou até cobrado demais por seus familiares.

É aí que a Gestalt – Terapia de Fritz Perls se concilia com as noções da Psicologia Analítica de Carl Jung. Nasce a persona onipotente, ou seja, o personagem que não pode falhar, que não pode parar, que não pode admitir fragilidade. Por trás dela, há medo, cansaço e, muitas vezes, adoecimento, sem falar ainda da inveja e da sensação constante de culpa e de não merecimento.

A rotina vai se tornando cada vez mais extenuante a cada reprovação. 5, 6, 7, 8 horas diárias de estudo, cada vez menos vínculos afetivos, culpa quando não se estuda ou culpa até mesmo quando se estuda porque acha que não foi o suficiente.

O corpo fala muito durante esse processo: insônia, ansiedade, automedicação, mas essa voz gritante é silenciada pela mordaça dogmática concurseira. É inadequado simplesmente ser humano.

Nesse contexto, Carl Rogers entende que o self se torna esvaziado, pois o candidato segue repetindo padrões que são seus, e que não levam à satisfação. O ciclo, que deveria terminar em realização, termina em vazio, em falta de lógica e de perspectiva.

Veja: O que o concurseiro chama de “ter disciplina” é, na prática, um bloqueio de contato. Ele deixa de sentir para conseguir continuar. E quando finalmente alcança a aprovação, descobre que o prazer não veio junto, porque o prazer estava no contato, não na meta. Se pensarmos sob a ótica da psicologia da felicidade (veja o filme “Poder Além da Vida), o prazer estava no caminho, e não na linha de chegada. Acha que estou enganado? Pesquise casos de juízes, promotores ou desembargadores que praticaram suicídio e reflita: o ato de autoextermínio foi condizente com a imagens que eles passavam externamente no exercício do cargo?

Em termos de Gestalt – Terapia, o candidato se desajusta criativamente, ou seja, ele tenta insistentemente se adaptar, mas sem se permitir ser quem ele é. A verdadeira saúde não está em passar, mas em conseguir estar presente no processo, em sentir prazer com cada avanço, do seu jeito, da sua forma e no seu ritmo.

Enquanto o estudo for visto como tortura, o cérebro continuará associando-o à dor, sabotando o próprio desempenho.

Enquanto a aprovação for a única forma de se sentir digno, o contato com a própria humanidade continuará interrompido.

O ciclo do contato ensina uma coisa simples e difícil: não há satisfação sem presença. O desafio do concurseiro jurídico não é apenas passar. O seu desafio é voltar a se encontrar no caminho.

Comente abaixo o que acha a respeito desse assunto? Um abraço!

Você já prestou atenção à sua chama azul?

A chama reverbera de forma branda e azulada quando o combustível que a mantém está no fim. Talvez, de tão azulada, nesses instantes ela se confunda com o próprio céu. Um céu que, às vezes, nos oferece serenidade, mas que em outras ocasiões parece estancar as emoções, deixando-as suspensas no ar, tal qual como o calor que não queima.

Ela surge de maneira quase imperceptível e pode trazer um breve acalento, mas em seguida se esvai e se espalha para diversos lados. Nesse movimento, emergem em nós sensações de imperfeição, de incompletude, como se as emoções fossem brandas demais para serem plenamente vistas. Só os olhares mais atentos talvez fossem capaz de constatá-las.

Carl Rogers (1961) lembrava que é justamente na aceitação incondicional das nossas emoções, sem julgamento, que nos aproximamos daquilo que somos em nossa essência. Esse acolhimento não significa aprisionar os afetos em categorias fixas, mas, ao contrário, permitir que eles fluam, que se transformem, que revelem nossa humanidade no processo de viver.

Na perspectiva da Gestalt-terapia, Perls, Hefferline e Goodman (1951) descrevem esse mesmo fenômeno como contato, que é uma espécie de dança viva entre o organismo e seu ambiente. Quando interrompemos esse fluxo, as emoções se tornam rígidas, estagnadas, e sentimos a dor da não-completude. Mas quando nos abrimos à experiência, mesmo aquela mais sutil, nos permitimos estar verdadeiramente presentes, favorecendo a possibilidade de integração e de alcance de flexibilidade cognitiva na tomada de decisões.

Percebo, assim, que podemos simplesmente acolher o ir e vir das emoções, sem necessidade de rotulá-las ou de segurá-las com força. Elas podem se apresentar como chamas brandas, quase invisíveis, mas é no acolhimento desse fluxo que nos tornamos mais inteiros. Como diria Merleau-Ponty (1945), “é na experiência vivida, no corpo que sente e no olhar que se abre ao mundo, que encontramos a plenitude do ser”.

E vou mais além. As emoções vêm e vão. Muitas vezes acreditamos que somos incapazes de percebê-las. Há quem se defina incapaz de amar, ou de perdoar, ou até mesmo de aceitar mudanças na forma de agir, ainda que elas claramente estejam lhe causando intenso sofrimento. Está tudo bem, e tomar consciência é algo que exige tempo. Cada um tem o seu e é preciso respeitar isso.

Assim como quase não enxergamos uma chama azul, frágil e sutil, aceitá-la com presença, sem medo e sem pressa, pode ser a chave para que você encontre a serenidade que nasce do simples ato de ser.

Referências

Rogers, C. (1961). Tornar-se Pessoa.

Perls, F., Hefferline, R., & Goodman, P. (1951). Gestalt – Terapia.

Merleau-Ponty, M. (1945). Fenomenologia da percepção.